O Procurador e o Filet Mignon

Hoje o meu filho, 12, L_0024me contou uma piada:

“Um jovem foi a um restaurante elegante e pediu Filet Mignon. Almoçou e na hora de pagar a conta avisou que não tinha dinheiro. O garçom advertiu-o de que se não pagasse a conta teria que lavar os pratos. O jovem retrucou que era filho do Procurador. O garçom chamou o dono do restaurante que disse ao jovem:

– Se você é filho do Procurador, vou acompanhá-lo até a sua casa.

Na casa do jovem os dois foram recebidos pela mãe do rapaz que disse que o Procurador estava no ferro velho ao lado.

O dono do restaurante caminhou mais alguns passos até o estabelecimento comercial e perguntou a um homem de aparência humilde se o Procurador se encontrava no local. Nesse momento homem à sua frente orgulhosamente se apresentou como Procurador e se colocou à disposição para encontrar qualquer peça de que ele precisasse”.

Recentemente um outro Procurador nos surpreendeu ao firmar um acordo de delação premiada com os donos de um frigorífico que além de todas as variedades de carnes que vendem, compraram praticamente toda a classe política do país.

Pelo acordo firmado, os empresários e criminosos confessos, foram perdoados de seus crimes pretéritos e livrados de futuras investigações.

Hoje vivem fora do país. Longe de todos os problemas, gastando o dinheiro público, enquanto milhões aguardam que a vida retorne ao normal, as empresas voltem a contratar, os consumidores comprem, os bandidos sejam presos, etc.

Esse acordo, se é que se pode chamar de acordo essa chacota, não tem os requisitos legais mínimos para ser homologado pela justiça e, se o for, será lembrado como o maior golpe aos cofres públicos da história da civilização ocidental em que os criminosos ainda saíram livres.

O perdão na esfera criminal e o acordo de leniência relativo às penalidades pecuniárias representa a homologação do golpe contra os contribuintes que ficam assistindo esse absurdo sem ter a quem recorrer.

Também chega a nosso conhecimento que membro da equipe do Procurador que atuou no caso e ajudou a chegar ao acordo de delação premiada, passa a integrar a banca de advogados que representou os irmãos delatores no processo.

A pergunta que eu faço é: o que é preciso para que alguém com dinheiro vá para a cadeia nesse país?

Na minha humilde opinião, acordo de delação premiada deveria ser assim: em primeiro lugar é preciso que todo o dinheiro que foi roubado seja devolvido pela via do bloqueio e indisponibilidade de bens de propriedade desses empresários criminosos e seus familiares.

Acordo de leniência não deve existir. Nenhuma autoridade tem poder para distribuir dinheiro público em troca de confissões. As confissões são para escapar da cadeia.

Dessa forma, a Receita Federal, a Controladoria Geral da União, o CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica, o Banco Central, o BNDES – Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social, as Fazendas Estaduais e Municipais e todos os demais órgãos da administração pública que foram lesados tem que ser mobilizados para apurar os crimes e aplicar as penalidades previstas em lei a esses criminosos.

Tudo com a mesma rapidez com que foi fechado o “acordo de delação premiada”.

Todos os donos de empresas do setor em que atuam os irmãos precisam ser indenizados pela concorrência desleal que sofreram nos últimos anos, inclusive os que foram a falência e os que foram obrigados a se desfazer de suas empresas.

Os consumidores têm que ser indenizados pela falta de concorrência com evidentes prejuízos em termos de qualidade, confiabilidade e preço dos produtos que consumiram.

Esse império, construído com dinheiro roubado dos contribuintes (eu e você) não pertence aos irmãos delatores. Portanto, tem que ser restituído em sua integralidade, com todos os acréscimos legais.

Também é preciso investigar a especulação financeira com ações e divisas estrangeiras feitas no interregno entre o acordo e a sua divulgação.

Por fim, os acionistas não controladores, desvinculados do grupo empresarial e de seus administradores, devem ser indenizados pelas perdas experimentadas após a divulgação do “acordo de delação premiada”.

Um acordo de delação premiada, para receber esse nome, não pode resultar em redução das penas privativas de liberdade superior a cinquenta por cento.

As multas, a perda do direito de contratar com a administração pública e a devolução do dinheiro surrupiado não podem ser objeto de acordo de leniência.

Acordos de delação premiada e leniência não podem ser convertidos em tratados de impunidade. A entrega graciosa de dinheiro público não é acordo: é crime.

Nenhuma autoridade neste país tem poder para firma acordo nesses termos.

Espero que o Poder Judiciário indeferia o pedido de homologação e determine a prisão imediata desses criminosos.

Se o dono do restaurante pudesse falar, diria:

“Senhor Procurador eu vou levar todas as partes e peças de uma Brasília roubada que foi trazida para cá. Também gostaria que os criminosos fossem presos”.